25 de agosto de 2013

Eu: racista, machista e homofóbico

O professor e as minorias
___Durante a minha carreira como professor, eu me esforcei muito para lutar contra os preconceitos que oprimem as minorias. Várias vezes alguns alunos mais reacionários ficaram realmente incomodados com as minhas posições. O incomodo que sente quem ataca os mais fracos não me incomoda; para falar a verdade, fico feliz de provocar nesses alunos outras formas de pensar. Só que existe outro lado dessa história: mesmo sendo aberto, mesmo tentando entender e ajudar os oprimidos, eu também já fui acusado de opressor. 
___Recentemente, duas alunas vieram me entregar uma carta. Diziam que, em aula, tomei atitudes que ajudam a propagar o racismo e o machismo. Faz alguns anos, logo que uma aula acabou, outras duas alunas vieram me dizer que eu havia dado um exemplo homofóbico. Em ambas as situações, minhas principais atitudes foram agradecer e me desculpar. 
___Depois, em casa, com calma, parei e revi cada passo daqueles casos. Tive vontade de agradecer e me desculpar novamente. E, principalmente, pensei o que eu precisaria fazer para não repeti-los. 
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Mania de perseguição
___No caso mais recente, como eu tinha a carta em mãos, usei-a para conversar sobre a situação com alguns conhecidos para poder refletir melhor sobre o assunto. Grande parte deles disse que aquilo não era nada, que “Essas meninas estão paranoicas! Estão querendo ver machismo e racismo em tudo.”. 
___Não concordo. Não acho que minhas alunas são paranoicas, mas também, durante a minha aula, não achei que estava sendo racista, nem machista. Só que não sou eu que tenho que dizer o que é machista ou racista. Por mais que o racismo e o machismo me incomodem, eu não os sinto na pele. Quem tem de falar sobre os incômodos que sofre é quem realmente está sofrendo. Quem não está, tem de entender. Entender e tentar não causar mais sofrimento. 
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O caso de Cleópatra VII
___No começo do ano passado, eu e minha esposa adotamos uma cachorrinha vira-lata que nós chamamos de Cleópatra VII. Provavelmente ela foi muito maltratada antes de morar conosco e, por conta disso, tem medo de tudo. Nunca quer passear, vive a se esgueirar pelos cantos da casa e rapidamente se esconde tão logo alguma visita aparece. 
___Trata-se de uma cachorra medrosa, que tem medos que outros cachorros não têm. Qual é a melhor atitude a tomar? Dizer “Isso não é nada. Essa cachorra é uma paranoica! Fica com medo de tudo.” e, então, dar um pontapé? 
___Se a Cleópatra VII tem seus medos, eu tenho é de entendê-la, não maltratá-la. O objetivo não é oprimi-la mais. Gosto dela e quero que ela seja uma cachorrinha feliz.*
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Os Donos da Verdade
___“Você quer que nós acatemos qualquer acusação de preconceito só porque ela foi feita por negros, transexuais, mulheres, hobbits, homossexuais ou coisa que o valha?”. Não. Eu quero que aquilo que qualquer grupo oprimido chame de opressão seja visto com a maior das atenções, seja pensado e repensado. E que você que não passa por aquilo saiba que para o outro, para aquele que é oprimido, aquilo está incomodando. Aí eu pergunto: ao saber disso, a melhor atitude é continuar sendo incomodo?
___Minha atitude foi e continuará sendo me desculpar. Desculpar-me e refletir muito sobre o assunto para tentar, cada dia mais, não agir de maneira escrota. 
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P.S.: A empresa em que o meu amigo Alex Castro trabalha passou por algo parecido no ano passado e ele escreveu sobre o assunto. Fica o link
P.P.S.: Em todos os meus anos como professor, só tive uma aluna transexual. Seu nome na chamada era masculino e, assim que soube da sua situação, perguntei como ela preferia ser chamada; ela me deu seu nome feminino que, prontamente, coloquei na chamada. Para mim, pareceu a coisa mais normal do mundo a se fazer. No fim do ano ela veio me agradecer, contando que eu era o único professor da escola a tratá-la como mulher. Quando fui comentar isso na sala dos professores, eu, homem heterossexual cisgênero, quase fui linchado. Imaginem como era horrível para essa aluna ter aula com professores assim.
Transfobia

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* Vale contar que nós adotamos mais uma cachorrinha, a Isabel Allende, para tentar dar mais coragem à Cleópatra VII e isso tem funcionado muito bem.  

16 de agosto de 2013

Questões médicas

___Quando eu vejo todas as discussões atuais sobre a classe médica e o governo, muitas vezes penso o que diriam certas pessoas que já se foram.
___Abaixo o Henfil, na década de 1970.
Medicina

11 de agosto de 2013

A humilhação pública e os seus limites

___Viralizou, faz uns dias, um vídeo em que algumas pessoas, ao encontrar o imbecil do deputado Marco Feliciano em um voo, resolveram cantar a música “Robocop Gay”, dos Mamonas Assassinas, para “homenagear” todo o preconceito do político do PSC. Todo mundo que eu vi compartilhando o vídeo, tratou-o de maneira positiva. Pessoalmente, acho ótimo que incomodem o pastor Feliciano, acho que ele tem de ser achincalhado o tempo todo mesmo, mas o que aconteceu no vídeo me incomodou. 
___Por mais positivo que seja constrangerem publicamente um homofóbico como o Feliciano, acredito que os manifestantes passaram do limite em um ponto: tocar no pastor. 
___Talvez alguém diga: “Ah, Ulisses, seu mala, o máximo que fizeram foi dar uma passadinha de mão no cabelo dele.”. E eu vou retrucar: E por acaso tocar na pessoa é pouco? Você vai defender o homofóbico que “só quis dar um empurrãozinho” no homossexual para “ele parar de ser tão afetado”? Vai achar correto o machista que “só” deu uma passada de mão na moça porque “ela estava pedindo! Olha a roupa dela!”?
___“Ah, mas é diferente! Aí é uma agressão.”. Eu pergunto onde está o limite da agressão? Se o cara é homofóbico e racista como o Feliciano nós podemos passar a mão no cabelo dele e só? Ou também dá para provocar passando a mão na bunda? Vale dar um tapinha na cabeça? E um murro na cara? Digam-me, queridos, qual é o limite?
___A vantagem de achincalhar, de se humilhar publicamente um homofóbico, é que ele aprende, cada vez mais, a não demonstrar esse tipo de coisa. O homofóbico que está sendo humilhado e outros que estão observando passam a ter receio de mostrarem a sua homofobia, aprendem que as outras pessoas não veem suas ideias heteronormativas como aceitáveis. Com sorte e com o passar do tempo, a homofobia diminui. 
___Já um toque tem uma boa chance de levar a um retoque. Uma mão no cabelo tem uma chance bem maior de resultar em um soco na cara. Não que um achincalhe verbal não tenha, mas palavras provavelmente serão respondidas com palavras, o que só vai expor mais ainda os preconceitos do homofóbico, só vai, mais ainda, torná-lo mal visto. 
___Longe de mim defender um escroto como o Feliciano, mas acho bom ficar bem atento às formas de atacá-lo. Como eu bem disse em outra postagem, é bom tomar cuidado para não ser tão criminoso quanto o próprio bandido.
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P.S.: Falando em tocar na pessoa, para demonstrar como isso é uma agressão muito maior, tenho um vídeo para linkar. Caco Barcellos, um dos melhores, mais humanos e corretos jornalistas do país, um cara que sempre lutou pelas minorias,* foi expulso de uma das manifestações contra o aumento das passagens simplesmente por trabalhar, atualmente, na Globo.
___Calmo, Caco Barcellos percebeu que a massa dos manifestantes era formada simplesmente por um bando de ignorantes quem nem imagina o quanto o trabalho que ele já fez é importante. Barcellos sabia que aquela reação contra ele era feita por pura ojeriza à Globo, que quem se manifestava contra ele, não o conhecia; para os manifestantes, ele era apenas um repórter genérico da Globo. Notem pelas reações do jornalista que o que realmente incomodava eram os toques, que, como é bem fácil perceber, facilmente poderiam chegar a uma agressão mais grave.

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* Recomendo fortemente seus lindíssimos livros Abusado, o dono do morro Dona Marta e Rota 66 – A Historia da Policia que Mata.

Atualização (13/VIII/2013): Comentário lindo do pessoal do Bule Voador

8 de agosto de 2013

Curso: A magia da realidade – uma visão das Ciências Humanas e Biológicas

Calendário atualizado em 26/IX/2013.
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___Quase todo ano eu ofereço para os meus alunos do Ensino Médio algum curso extracurricular sobre algo que eu entendo, mas que normalmente fica fora da grade normal de um curso de História –, seja por falta de tempo, seja por falta de interesse do Poder Público. Já dei cursos sobre a História da dança de salão, do xadrez, dos povos pré-colombianos, sobre mitologia nórdica, já analisei, as vezes durante todo o ano, livros como A Divina Comédia, de Dante, O Cavaleiro Inexistente, de Italo Calvino, ou o Decameron, de Boccaccio. 
___No segundo semestre do ano passado, retirei da pedra um curso sobre lendas arturianas com uma professora de Literatura. O bom resultado me animou a tentar outro curso interdisciplinar, só que, desta vez, com uma área não tão próxima. Neste ano, darei um curso com um professor que, faz anos, eu admiro: o biólogo Fernando Domenico.*
___O curso foi inspirado por Deus na obra A Magia da Realidade, o novo livro de divulgação científica (excessivamente ilustrado) de Richard Dawkins. Além dele, são apoios praticamente obrigatórios as obras de Carl Sagan –, principalmente o livro O mundo assombrado pelos demônios e o livro e documentário Cosmos.
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___Segue o cronograma do curso:
- Aula 1 (dia 5/IX): Introdução, professores Trida e Fernando. 
- Aula 2 (dia 12/IX): O conhecimento mitológico é científico?, professor Trida. 
- Aula 3 (dia 19/IX): O misticismo, a pseudo-ciência e as falhas da percepção humana, professor Fernando. 
- Aula 4 (dia 26/IX):  Os ombros dos gigantes, professor Trida. 
- Dia 3/X: A aula deste dia foi transferida para a semana seguinte por conta de uma atividade escolar. 
- Aula 5 (dia 10/X): A navalha de Occam e outras ferramentas céticas, professor Fernando. 
- Aula 6 (dia 17/X): Da Idade das Trevas ao Século das Luzes, professor Trida. 
- Aula 7 (dia 24/X): Mas afinal, por que ser cético?, professor Fernando. 
- Aula 8 (dia 31/X): Divulgação científica, professores Trida e Fernando. 
- Aula 9 (dia 7/XI): Debate sobre o capítulo 11, “Por que coisas ruins acontecem?”, do livro A Magia da Realidade, de Richard Dawkins, e fechamento do curso, professores Trida e Fernando. 
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___O curso irá ocorrer às quintas-feiras (de 5 de setembro a 7 de novembro), do 12h10min até 12h55min, na sala 16T, do prédio Ary Torres, da Etesp.** A entrada é completamente gratuita e livre para qualquer interessado. 
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P.S.: Aproveitando o convite para o meu curso, fica aqui um link para o trailer da nova versão de Cosmos, estrelando, desta vez, Neil deGrasse Tyson.

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* Para quem se interessa por Biológicas, a especialidade do Fernando é gafanhotos. Links aqui para o mestrado e para o doutorado dele. 
___Aproveitando a nota de rodapé, vale dizer que eu já dei algumas aulas junto com o Fernando, analisando o livro Admirável Mundo Novo, do Huxley, e tudo funcionou muito bem. 
** Av. Tiradentes, nº 615, Bairro do Bom Retiro, São Paulo, SP. Bem pertinho do metrô Tiradentes. 


1 de agosto de 2013

Cachecol = Bicha

Homem de cachecol
___Por conta do frio absurdo que veio para Sampa no fim de julho, fui para o trabalho usando cachecol. Mal entrei, um colega metido a engraçadinho me olha e diz:
___– Sabia que não dá para um homem usar cachecol sem parecer bicha?
___Olho para o meu lindo cachecol marrom e acaricio suas franjinhas. Viro para o meu interlocutor e digo:
___– Sabia que não dá para falar uma coisa dessas sem parecer homofóbico?
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___Para fechar a postagem, uma tirinha da bela série do Laerte contra o machismo, a homofobia e seus sequazes. 
Piada Velha, por Laerte