9 de dezembro de 2017

Defendendo a própria causa com unhas, dentes e burrice

___Como já contei aqui, gosto de levar minhas cachorras para brincar perto da Paulista Aberta. Uma das travessas da Avenida Paulista fica fechada para os carros aos domingos (e com placas de proibido estacionar a semana inteira) e, por conta disso, vários donos soltam seus cachorros por lá. No último domingo, um enorme caminhão de som estava estacionado nessa travessa. Ao lado do caminhão, vários dizeres contra a corrupção, inclusive uma faixa escrita “Avança Lava Jato”.
___Se muito não me engano, tratava-se do caminhão desse protesto aqui. Mas, se não foi, não faz diferença nenhuma para o assunto do texto. 

Logo do "Movimento Avança Brasil"

___Fiquei brincando com as cachorras até que duas mulheres com bandeiras do Brasil e um homem começaram a se aproximar do caminhão. Percebi que eram as pessoas que haviam alugado aquele carro de som. Cheguei perto de uma das mulheres e, tentando ser o mais delicado possível, falei:
___– Com licença. Posso fazer uma pergunta?
___– Claro – respondeu a moça. 
___– Não é um pouco errado protestar contra a corrupção e, ao mesmo tempo, estacionar o caminhão de som, antes do protesto, bem ao lado de uma placa de “Proibido estacionar”?
___Na hora, a mulher se alterou e, falando alto, disse que ela podia estacionar ali. O homem se aproximou, mais violento ainda, dizendo: “O que você é? É guarda de trânsito, por acaso?” e saiu para chamar a outra mulher.
___Eu não estava fazendo nada demais, só perguntando. Nem estava usando meu boné do MST e minha camiseta com a estampa do Sérgio Moro decapitado.* Continuei tentando ser calmo e delicado: “Olha, eu realmente só quero saber se vocês não percebem que isso entra em contradição com o discurso de vocês?”, continuei falando para a primeira mulher. Vendo que eu não estava agressivo, que só estava mesmo curioso, ela se acalmou e começou a me explicar que a prefeitura havia permitido que o caminhão fosse estacionado naquele local, que ali era perto de onde ia começar o protesto, etc.. 
___Enquanto a moça me explicava, a outra mulher e o cara ficaram meio de longe gritando comigo: “E aquele carro estacionado ali? Você não vai reclamar?”; “Você apoia a corrupção!”; “Vai pra Cuba!”; “Corrupto!”. 
___Agradeci a moça que conversou comigo pela explicação, afastei-me e fui brincar mais com as minhas cachorras. 
___Não sei se a mulher me disse a verdade, não sei se a prefeitura permitiu mesmo que eles estacionassem ali. Esse, vale dizer, não é o ponto do texto. Contei toda essa história para dizer que, se você está fazendo um protesto, é melhor procurar aliados, adeptos, não é bom fazer inimigos. Se alguém vai falar com você, questionar a sua manifestação, não agrida a pessoa. Explique para ela os seus motivos. Se ela não quiser ouvir, lembre-se: é você que está se manifestando, é você que está procurando apoio, não ela. Não a agrida. Isso vai afastá-la e afastar, também, outras pessoas. 
___Isso vale para qualquer grupo. Não concordo com a maior parte dos pontos defendidos pelo Arthur Moledo do Val, do canal Mamãe Falei, mas não acho certo que as pessoas o agridam quando ele aparece em alguma manifestação de esquerda questionando os participantes. “Mas, Ulisses, ele provocou?”. E daí? As pessoas do “Avança Lava Jato” cometendo infrações de trânsito podem ter falado a mesma coisa de mim. Se elas querem defender algo, elas tem de lutar por isso. Inclusive, lutar contra a vontade de enforcar em arame farpado qualquer pessoa que as questione. Se você não é capaz de agir civilizadamente quando alguém questiona qualquer coisa ligada aos seus pontos de vista, saiba: você está fazendo mais mal àquilo que você defende do que bem. 

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* Só para evitar que algum maluco apareça gritando nos comentários, fiz o comentário apenas para tornar o texto mais divertido. Eu não tenho uma camiseta com a estampa do Sérgio Moro decapitado e nem usaria algo assim. Boné do Movimento Sem Terra eu tenho mesmo.