7 de dezembro de 2009

Think different

___Sair dos padrões dá muito trabalho; viver à margem da sociedade é extremamente difícil. Em contrapartida, apregoar que se vive de maneira diferente, é fácil e bastante compensador (você se sente melhor consigo próprio e uns compradores de discurso lhe concedem admiração).



___Por mais estranho que seja o humor do Doug Allen, é assim, à margem, que o Steven, sua mais famosa personagem, vive a maior parte do tempo.



___Claro que facilmente alguém pode me retrucar que é só ficção, que é uma história de absurdos, que estamos falando de quadrinhos. Devolvo com um dos meus exemplos preferidos: Jack London. O escritor norte-americano sentiu na própria pele muito do que escreveu. O exemplo que escolho agora, para combinar com a tirinha, encontra-se entre as experiências do rapaz como mendigo.




___“Deixe-me dizer aqui que Otawa, com uma única exceção, é a cidade mais difícil dos Estados Unidos e Canadá para se mendigar uma peça de roupa... (...) Às oito em ponto da manhã eu saí atrás das roupas. Trabalhei com energia o dia inteiro. Juro que andei mais de 60 quilômetros. Conversei com mulheres de quase mil casas. Não parei de trabalhar nem para jantar. E às seis da tarde, depois de dez horas de incessante e deprimente labor, possuía apenas uma camisa, enquanto o par de calças que tinha conseguido era pequeno e mostrava todos os sinais de uma breve desintegração.” (Trecho do conto “De vagões e vagabundos: memórias do submundo”).



___Notem que London utiliza o termo “trabalhar” para falar de sua atividade mendicante. Para muita gente, um disparate sem par. Um olhar mais ameno, entretanto, poderia lhe dar razão. Escolha viver com pouco; decida não ter morada fixa; ande o dia todo a esmolar. Fácil não é. Olhe sem preconceito, não é tão difícil assim encarar a mendigagem também como um serviço. Talvez o pensamento atípico até evite que você, caro leitor, olhe com nojo – como quase todos fazem – para o próximo pedinte que lhe cruzar o caminho.


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P.S.: Minha inspiração primeva para produzir este texto foi uma ótima postagem escrita pelo Marcus Nunes em resposta ao sucesso feito por um interessante escrito do Dahmer.


P.P.S.: O catalisador, que tirou meu texto da pasta de rascunhos, foi a série de exercícios de empatia que o Alex Castro propôs. Se o tema do meu artigo interessou, vale experimentar.


P.P.P.S.: Falando de pensar diferente, fica a indicação do Panóptico.


P.P.P.P.S.: Por fim, fecho com um comentário sobre a tradução da tirinha. No original, as últimas palavras de Steven formam a expressão “cake taker”. A tradução literal (algo como “tomador/ladrão de bolo”) não se encaixa direito em português; mesmo assim, existem várias expressões correlatas. Escolhi “empata foda” porque combina bem com as grosserias típicas da personagem e não escapa da ideia original.

4 comentários:

  1. Caros leitores... "Think different"... vocês são capazes de fazer mais de 50 comentários para o texto acima porém, não são capazes de fazerem sequer, 1 comentário para um texto brilhante e genial como este... por favor... pensem diferente!!!

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  2. Que bom saber que não sou só eu que penso diferente, rs.

    E que empata foda filho-da-puta!

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  3. [...] Uma leitora reclamou que minha escolha de traduzir, na tirinha anterior, “cake taker” como “empata foda” não foi feliz. Ela disse que, mesmo combinando com as [...]

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  4. [...] mas achei que valia à pena um parzinho dos textos sobre política que costumo publicar aqui. - “Think different”. Não só é uma postagem com uma das minhas traduções de tiras, como eu ainda trabalho com [...]

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