18 de janeiro de 2012

Dificuldade de reagir

___Funcionária pequena de um grande hospital de São Paulo. A cara toda roxa, só um olho aberto, braços completamente marcados, mancando. Mais um pouquinho, pareceria Jesus Cristo em filme do Mel Gibson. Para todos que perguntam pelo caminho, ela fala, rapidamente, que caiu da moto. Chegando à secção em que trabalha, local mais privado, só com três outras pessoas, suas colegas mais íntimas, a pobre funcionária cai no choro.
___Sem que seja necessária muita insistência das colegas, a funcionária conta que apanhou, novamente, do marido.
___– Achei que ele ia me matar...
___As colegas falam que ela tem de ir a uma delegacia. Chorando, a esposa agredida conta que foi, logo depois da surra.
___Antes que alguém pudesse perguntar o resultado, a esposa agredida começou a chorar mais, dizendo que os policiais disseram que não podiam fazer nada, que ela deveria ir a uma delegacia da mulher. “Aí eu tive que voltar para casa. Não tinha onde dormir. ’Inda bem que ele já tava pregado no sono.”.
___Algumas horas depois, uma das colegas falou que havia conseguido arrumar o telefone da delegacia da mulher mais próxima. Na hora do almoço, todas se reuniram para ligar.
___A esposa agredida, tentando conter o choro, respondeu às perguntas que lhe eram feitas e, pouco depois, desligou. Mal colocou o telefone no gancho, as lágrimas voltaram a cair. Haviam dito a ela que o ideal seria ir à delegacia, diga-se de passagem, o melhor mesmo era ir à delegacia mais próxima à casa dela, não aquela.
___A 8ª Delegacia de Defesa da Mulher, de São Mateus, a mais próxima da casa da esposa agredida, ficou com o telefone ocupado até o final do dia de trabalho. Com o término do expediente, todas foram juntas para o ponto de ônibus.
___A esposa agredida, mesmo com medo de voltar para casa, não chorava mais. Se foi direto para casa ou à delegacia da mulher mais próxima quando entrou no ônibus, eu não sei.


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P.S.: Sim, o caso é real.
P.P.S.: Essa história estava na gaveta fazia um tempinho. No entanto, tudo o que as pessoas andam falando sobre o estupro no BBB (principalmente o texto do Alex, no Papo de Homem, e o que a Letícia F., do Cem Homens, tem falado) me deixaram sem alternativa: tive de compartilhar o texto.
P.P.P.S.: Lidar com o próprio caso de violência doméstica já é extremamente complicado. Seria tão melhor se o serviço público não acabasse por ser mais um entrave.*


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* Meu objetivo não é criticar aqueles que atenderam a moça e a mandaram para outro lugar. Imagino que deva mesmo ser difícil para um policial de uma região ajudar alguém de outra, imagino que as instruções que os policiais recebam sejam exatamente essas. Isso, entretanto, não exime o poder público que deveria arrumar meios de atender os cidadãos da melhor maneira possível.

4 comentários:

  1. Eu acho que podia ter um sistema que a pessoa ligasse a fizesse a denúncia ou queixa e já fosse encaminhada para a delegacia correta. Realmente poupava muito tempo.

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  2. A triste realidade das mulheres agredidas pelo marido.
    Mais triste ainda são as que não "querem" tomar atitude diante da situação.
    E pior ainda é quando elas querem tomar atitude mas a autoridade não auxilia, coloca obstáculo ou não informa o que elas devem fazer.

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  3. Leonardo,
    vc tem razão. Mas eles fazem de tudo para dificultar.

    Pior é que tem um telefone que funciona 24hs mas serve apenas para orientação e "apoio". Porém, as informações que eles dão lá, como de onde ir, e o que fazer, etc.

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  4. ... nem sempre é o que ocorre na realidade...

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