Minha parte preferida da introdução do clássico The
Canterbury Tales, de Geoffrey Chaucer, é quando ele descreve o “folgazão e
alegre” Huberd, o frade mendicante. Chaucer começa dizendo que, entre as ordens
religiosas, “não havia ninguém que conhecesse melhor as artes do galanteio e da
linguagem florida; e para as mocinhas que seduzia ele arranjava casamento às
próprias custas.”. Sempre pesando na ironia, ele descreve que o frade “Era um
nobre pilar de sua irmandade! Conquistara a estima e a intimidade de todos os
proprietários de terras de sua região, assim como de respeitáveis damas da
cidade, – pois, conforme ele mesmo fazia questão de proclamar, por licença
especial de sua ordem tinha poder de confissão maior que o do próprio cura.
Ouvia sempre com grande afabilidade os pecadores; e agradável era a sua
absolvição. Toda vez que esperava polpudas doações, eram leves as penitências
que impunha, porque, do seu ponto de vista, nada melhor para o perdão de um
homem que a sua generosidade para com as ordens mendicantes: quando alguém
dava, costumava jactar-se, sabia logo que o arrependimento era sincero. A
tristeza só não basta, pois muita gente tem o coração tão duro que, mesmo sofrendo
muito intimamente, não é capaz de chorar. Por isso, em vez de preces e prantos,
é prata o que se deve ofertar aos pobres frades.”.
É impressionante ver que um texto do século XIV pode
encontrar tanto eco nos nossos dias. Ainda mais em um momento em que hordas de
pessoas se juntam para atacar um religioso como o padre Júlio Lancellotti que realmente
se dedica àquelas pessoas que nada têm. Bem diferente de Lancellotti, boa parte
dos que pregam a Bíblia fazem como o frade medieval descrito por Chaucer
que “Conhecia as tavernas de todas as cidades, e tinha mais familiaridade com
taverneiros e garçonetes que com lazarentos e mendigas. Não ficava bem para um
homem respeitável de sua posição privar com leprosos doentes: lidar com esse
rebotalho não trazia nem bom-nome nem proveito; por isso, preferia o contato
com os abonados e os negociantes de mantimentos.”.
Ao
falar sobre as roupas do frade mendicante, ele conta sobre o “respeito que
incutia, pois não lembrava um frade enclausurado, – com as roupas andrajosas de
algum pobre clérigo, – mas sim um Mestre, ou mesmo um Papa. Seu hábito curto
era de lã de fio duplo, redondo com um sino saído da fundição.”. Voltando pro
século XXI, tenho me divertido (e me entristecido) muito com o trabalho do @outfitdotemplo.
Aposto que Chaucer iria ficar com a mesma sensação. Tão longe e tão perto...
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P.S.: Citações retiradas
de CHAUCER, Geoffrey. Os contos de Cantuária. São Paulo: T.A. Queiroz,
1988. pp. 6-7.
P.P.S.: Quer ouvir umas
pessoas bacanas falando sobre Idade Média? Meu amigo Alex Castro acabou de
começar um curso sobre literatura chamado “Grande Conversa Medieval”. A didática
Aria Rita de quando em vez também resolve falar sobre o assunto focando em
música. Aproveite que ambos são maravilhosos.
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