30 de novembro de 2024

– E as crianças?

 

            Naqueles segundos em que duas pessoas semidesconhecidas ficam trancadas dentro de um elevador, muitas vezes rola um silêncio sem graça; em outras, aprofunda-se em um interessantíssimo tratado de meteorologia – “Tá quente, né?”. Não são essas as estratégias de uma vizinha que, recentemente, mudou-se para o meu prédio.

            Tentando aparentar intimidade, logo no primeiro encontro que minha esposa e eu tivemos com essa vizinha, após as protocolares trocas de cumprimentos, ela já mandou:

            – E as crianças, como estão?

            Estranhando um pouco e meio constrangidos, respondemos um “Bem...”.

Nos encontros futuros, o “E as crianças?” se repetia e o diálogo nunca caminhou muito mais que isso. Até que, em um final de semana, no início da noite, nós chegamos ao prédio, chamamos o elevador e, enquanto esperávamos, a vizinha chegou:

– Boa noite.

– Boa noite. Tudo bem? – respondi, enquanto abria a porta do elevador.

– Tudo. E as crianças, como estão?

– Ah, hoje devem estar um pouco chateadas. Passamos a tarde toda fora e elas ficaram sozinhas.

Estranhando a informação, a vizinha ficou um segundo parada depois de apertar o botão do sétimo andar. Virou-se, olhou nos olhos da minha esposa e perguntou:

– Mas... são crianças ou adolescentes?

– ... Éééé... São cachorros.

– Ah, tá.

Subimos o resto da viagem em silêncio.

 

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