10 de fevereiro de 2012

Torcendo pelo espetáculo

___Quando se vai a uma peça de teatro, palestra, espetáculo de dança ou qualquer outro evento ao vivo, o que mais se espera é que a apresentação seja brilhante, maravilhosa e que aqueles momentos na plateia sejam únicos. Claro, esse é sempre o principal desejo, o motivo pelo qual se sai de casa. Só que não é sempre que se pode ver algo fabuloso. Por isso mesmo, meu segundo desejo é sempre o da desgraça.
___Não sou maluco, não estou torcendo para que no meio de uma peça de teatro levante um idiota gritando “Receba-me, Alá!” ou “Seus pecadores! Agora Cristo vai julgar vocês!”, para depois se explodir e matar metade da plateia. Torço para que aconteça uma tragédia no palco.
___Fico querendo que o ator confunda as falas e agradeça Godot pela sua chegada antecipada, que o palestrante e o mediador saiam no tapa, que a dançarina tropece e derrube o parceiro para fora do palco. Se eu tive de pagar pelo evento, então, minha torcida pela tragédia é maior ainda.
___Eu sei que, falando assim, fica parecendo que sou uma pessoa maldosa, sem coração, que esmaga passarinhos na mão. Mas, não é bem assim. Meu principal desejo, como eu disse no primeiro parágrafo, é de ver algo fabuloso. Sendo assim, sempre sento na plateia torcendo pelo melhor, para que tudo dê completamente certo. Entretanto, se, no desenrolar da peça, eu percebo que nada está funcionando naquele palco; se, no começo da palestra, o maldito palestrante começa a ler um longo e monótono texto; se, depois de alguns passos, é possível perceber que aquela coreografia não foi bem pensada e talvez nem tenha sido ensaiada; se percebo que quem está no palco não teve respeito pelo seu público, torço pelo pior.
___As pessoas saíram do conforto dos seus lares para assistir aquilo, estão perdendo tempo da vida delas, o mínimo que os artistas, palestrantes e afins devem fazer é tentar proporcionar o maior espetáculo da terra. Se não se esforçaram ou não estão se esforçando, merecem mesmo o maior dos desastres. Se os artistas e palestrantes não são competentes para saberem que aquilo é ruim, têm mesmo é de sofrer.
___Se o ator ruim de uma peça péssima engasga e morre no palco, aquele momento medíocre torna-se fabuloso, único, digno de nota. Se o palestrante preguiçoso é questionado e humilhado pela plateia, se fica sem reação diante de perguntas inteligentes, aquela palestra vazia pode se tornar realmente um momento de aprendizado, pode vir a ser interessante. Torço pela desgraça porque torço pelo espetáculo, pelo fabuloso. Se quem está no palco não pôde proporcionar o esplêndido, que o Acaso possa.
___Por fim, é bom dizer, minha torcida pela tragédia é a mais humana e doce das atitudes. Pode até não parecer, se vocês pensarem apenas em quem está no palco ou no tablado, mas não são só os artistas e palestrantes que estão lá –, existe também todo o público. É algo simples e lógico: o bem de muitos (a diversão do público, da maioria) é mais importante do que o de poucos (dos artistas, do palestrante). E pelo menos a plateia vai ter algo de interessante para se lembrar.



4 comentários:

  1. Confesso que eu tenho esse mesmo sentimento algumas vezes!

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  2. Lembrei deste conto: http://www.releituras.com/lfverissimo_recital.asp

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  3. :-) Uma graça o conto, Ariadne. Realmente, não seria o espetáculo esperado, mas seria um espetáculo. Obrigado.

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  4. Eu, particularmente, torço pro dançarino começar a se atrapalhar com os adornos do seu figurino... rsrsrsrs

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