26 de outubro de 2007

Bom trabalho, querida leitora

_____“Você acha que com a merda de salário que eu ganho eu vou me matar para dar aula para esses delinqüentes?!?”. Quem, como eu, já trabalhou como professor, principalmente em colégios públicos, já deve ter ouvido alguns professores imbecis falarem coisas bem parecidas com as da frase anterior. Querem saber o que eu penso? Eu, cada vez que ouço sentenças desse tipo, desejo ardentemente que o infeliz do professor que falou aquilo seja atropelado na saída e morra, lentamente, preso nas ferragens do carro, com um grande sofrimento.

_____Sei muito bem que salários bons e condições decentes de trabalho podem fazer com que os professores consigam dar aulas muito melhores. Entretanto péssimos salários e condições horríveis de trabalho não são desculpas aceitáveis para não tentar dar uma boa aula.

_____No mês passado eu escrevi reclamando dos Postos de “Recarga” da Rede Pague Express e uma leitora chamada Keilla (que, imagino, trabalha em uma daquelas cabines) comentou na postagem esta semana esclarecendo algumas das minhas dúvidas. Porém, ela, também, defendeu o péssimo atendimento dizendo: “GOSTARIA DE DEIXAR CLARO QUE SE O PÚBLICO RECEBE UM MAL ATENDIMENTO, É PORQUE A EMPRESA EXPLORA SEUS FUNCIONÁRIOS DE UMA MANEIRA QUE VCS USUÁRIOS NEM SE QUER IMAGINAM... FUNCIONÁRIO "TRANCADO" NO ESTABELECIMENTO, TENDO QUE URINAR NA CABINE” (sic) e ainda completa “ANTES DE CRITICAR TEM QUE SABER A ORIGEM DAS COISAS.”.

_____Ótimo. Acho fantástico que divulguem as péssimas condições de trabalho existentes para os funcionários. Foi, exatamente, por denunciarem as péssimas condições de trabalho nas indústrias inglesas do final do século XVIII, início do XIX que os trabalhadores conseguiram adquirir alguns direitos. Porém, condições de trabalho medonhas não é uma desculpa para atender mal o público. Não importa quanto um médico de pronto-socorro público ganhe, nem quantos pacientes atendeu naquele dia, muito menos que materiais o hospital fornece, se você precisa de ajuda naquele momento você quer que ele dê o máximo de si.

_____Se as coisas estão erradas, se a empresa age de maneira escrota, reclame, faça greve, escreva para jornais, crie um blog para denunciar, mas não atenda mal o público. Não trabalhar direito, ainda mais em um serviço do qual grande parte da população depende, é a atitude mais nojenta que você pode tomar, seja você professor, médico ou vendedor de passagens de transporte público. Não trabalhar direito é a atitude tomada pela empresa safada que trata de maneira desumana os funcionários ou pelo governo que permite que as escolas e hospitais públicos fiquem como são.

_____Não deixe de denunciar os problemas do lugar em que você trabalha, querida Keilla, mas, atenção: não use esses problemas como desculpa para não atender direito os usuários do seu serviço. Se não for trabalhar direito por causa desses problemas, demita-se. Ou, então... na saída do trabalho olhe bem para os carros correndo na rua e...


P.S.: Aproveito o ensejo para indicar o ótimo texto “A praga do W.O. pedagógico”, de Júlio Groppa Aquino (meu professor), publicado em 2002 na revista Nova Escola (péssima revista, diga-se de passagem).

Nenhum comentário:

Postar um comentário