28 de dezembro de 2013

Convencido pela Política

___Eu não sou uma celebridade. Nem mesmo uma celebridade virtual. (A opinião da minha mãe, claro, não conta.) Mesmo assim, um monte de gente interessante já leu o que eu escrevo neste blog. E muitos desses leitores já me perguntaram qual é o meu Twitter. Sempre respondi que eu não tinha e não planejava ter. Só que agora eu fui vencido. ConVencido pela política.

Twitter

___Tenho o hábito de, periodicamente, escrever para alguns políticos. Quando um político que eu acompanho falta muito, acontece algum caso político interessante, um projeto de lei que me interessa foi modificado e assim por diante. Considero algo útil a se fazer e, na maior parte das vezes, as respostas são bem completas e informativas. Podem até me dar informação para não votar mais naquele ser. 
___Quando escrevo para uma pessoa qualquer, não costumo esperar resposta. As pessoas não são obrigadas a me responder nada. Mas, em minha opinião, os políticos têm de responder para a população. Se não todos, no mínimo os do Legislativo. 
___A resposta não precisa ser escrita pelo político. Um assessor, secretário ou coisa do tipo, pode muito bem responder –, desde que a resposta esteja condizente com as atitudes do político e que o político se responsabilize por elas. 
___É exatamente por isso que quando um político não me responde, depois de mais ou menos um mês, eu escrevo cobrando. Se continua sem resposta, abandono-o como eleitor. 
___Desta vez, quando escrevi novamente para o político, ele respondeu se desculpando e disse que, se a assessora dele demorar novamente para me responder, para que eu mandasse uma mensagem pelo Twitter pois é ele mesmo que o acessa. Pesei os pontos: tendo um twitter, eu poderia falar com os políticos por mais de um meio; sem contar que, nas eleições de 2014, é bem provável que tudo que é candidato arrume, no mínimo, uma conta no Twitter
___Portanto, queridos leitores, quem queria me ver no Twitter pode agradecer aos políticos. Não sei muito bem como usar aquilo ainda. De qualquer modo, quem quiser me ver por lá também, o endereço é http://twitter.com/incautosdoontem. Mas é bom dizer: eu ainda gosto mais de escrever aqui. 

27 de dezembro de 2013

Arte: bater e correr

___Um dos problemas de dedicar várias salas de um museu para colocar obras de apenas um artista, é que são necessários muitos trabalhos para ocupar os espaços – e nem todo artista tem tantas obras tão boas assim. Alguns museus, no fim das contas, tem até de apelar para inúmeros rascunhos para ocupar os espaços. Uma das vantagens é que o público consegue conhecer uma boa parcela da obra do artista e pode até formular opiniões mais aprofundadas sobre seus trabalhos. 

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___A Pinacoteca do Estado de São Paulo dedicou, até o final de fevereiro, um espaço bem grande para as obras de Antonio Henrique Amaral. Eu, que nunca havia ouvido falar do trabalho do moço, fiquei bastante satisfeito de conhecê-lo.

Antonio Henrique Amaral: Consensus, 1967
Consensus, 1967 

___Cada sala da exposição marca uma época da carreira do artista, começando com o final da década de 1950 e indo mais ou menos até os dias de hoje. O interessante é que é possível perceber fortemente como o posicionamento político do autor era claro e duro nas primeiras obras (ou quando ele estava fora do Brasil)* e vai se tornando mais abstrato com o passar do tempo. Quanto mais abstrato, mais difícil de perceber a crítica – e mais seguro também.

Antonio Henrique Amaral: Campo de batalha G2, 1976
Campo de batalha G2, 1976

___Boa parte das obras ataca duramente a Ditadura Militar. Outras, por segurança ou por falta de capacidade minha para interpretar, são tão abstratas que foi bem difícil tirar algo delas. Como, por exemplo, as obras da década de 1980.

Antonio Henrique Amaral: Árvore, 1982
Árvore, 1982

___Acredito que nas últimas obras, mesmo sendo bem mais abstratas, é até possível perceber uma crítica à sociedade contemporânea, a hábitos de consumo e coisas afins. Mesmo assim, parecem trabalhos bem mais leves que aqueles que atacavam o Regime Militar. De qualquer modo, vale bem passear pelas salas para comparar as obras.

Antonio Henrique Amaral: Monitor, 1987
Monitor, 1987

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P.S.: Aproveitando o assunto, no Memorial da Resistência (na Estação Pinacoteca) está acontecendo uma exposição com uma cronologia maravilhosa sobre os Os Advogados da Resistência, falando sobre a atuação dos advogados e da “Justiça” nos períodos ditatoriais.  

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* De 1971 a 1981, Antonio Henrique Amaral morou em Nova Iorque. 


25 de dezembro de 2013

O inferno é a falta de atenção dos outros

___Neste natal eu doei muitas das minhas roupas. Não que o espírito natalino tenha feito de mim uma pessoa melhor – digna de aparecer em um conto de Dickens –, simplesmente as férias permitiram que eu arrumasse o meu armário. Peguei algumas roupas que eu não usava desde que casei, coloquei-as dentro de uma mala de viagem e fui pegar o metrô para comer a ceia de natal com o meu irmão. 
___Como eu bem sabia, na plataforma da estação Trianon-Masp, ao lado da cabine dos funcionários, havia uma caixa para doações de roupas. Parei ao lado dela, abri a mala e, antes de colocar algo lá dentro, olhei. Para o meu espanto, vi que alguém havia jogado um sanduíche dentro da caixa. E não era um sanduiche novo, deveria estar lá há algum tempo. Coloquei umas três, quatro calças na parte limpa da caixa e peguei o metrô.
___Na estação Sumaré havia outra caixa perto das catracas. Nessa alguém havia jogado um chiclete. Resoluto, coloquei um saco plástico em cima do chiclete e depositei o restante das roupas. 
___Será que confundiram as caixas de doações com o lixo? Uma delas está posicionada ao lado das lixeiras, a outra a uns vinte passos de distância. Será que, mesmo com as palavras “Doações de roupas” escritas em letras grandes, alguém não percebeu e jogou um sanduíche? Penso na hipótese da distração porque me parece quase inconcebível que alguém, de propósito, jogue lixo em uma caixa de doações. 
___Também me parece inconcebível que alguém cuspa em uma criança de rua, chute um cachorro, dê uma garrafada em uma garota de programa ou taque fogo em um mendigo. Só que isso acontece. Existem pessoas que fazem isso. Por que, então, alguém não jogaria, de propósito, um sanduíche em uma caixa de doação? Mas, como eu nem imagino o que fazer com um imbecil desse tipo (ou com agricultores ricos que querem tirar terras de indígenas), vou voltar à hipótese da falta de atenção. 
___Eu entendo que a distração pode atrapalhar. Seu problema pessoal pode ser tão grande que você nem olhou direito para aquela caixa do metrô. Só viu a caixa, pensou que já era hora de parar de mastigar o seu chiclete e cuspiu. Não passou muito mais coisas pela sua cabeça. Assim como você não pensou em mais nada antes de jogar fora aquele sanduíche que não queria mais. Simplesmente você não prestou atenção. 
___E também não pensou naquele homem maltrapilho passando fome. Diga-se de passagem, você nem o vê direito, porque se você pensasse mesmo nos problemas dele e de todos os outros maltrapilhos que existem pelo caminho seria quase impossível andar por São Paulo.
___A falta de atenção com os outros é apenas um sintoma das doenças que fazem a nossa sociedade ser mais podre ainda. Inclusive a minha falta de atenção com as roupas no armário. Se não fosse a minha preguiça, elas poderiam ter sido arrumadas – e doadas – faz muito tempo. Alguém que estava precisando daquela calça poderia já estar com ela. Outras pessoas poderiam estar até com algumas das roupas que ficaram no armário após a arrumação. Só que eu não pensei nelas na hora que eu organizei o armário. Não dei a devida atenção aos problemas que não eram meus. Assim como a pessoa que jogou o sanduíche na caixa de doações de roupas. 


21 de dezembro de 2013

Colocando roupa para secar: lição básica

___Quando for estender roupa no varal, sempre use uma vestimenta com bolsos. Sem isso, você vai acabar demorando mais tempo pegando pregadores para cada peça de roupa ou vai segurar tantos pregadores que acabará derrubando-os – ou pior, derrubando a roupa. 

17 de dezembro de 2013

Quebrando vitrines

___Ouvir outros pontos de vista é algo que, muitas vezes, serve como um bom apoio para reflexões. Ainda mais se esses pontos de vista são de alguém interessante. 

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___Comecei a ler o livro O que é isso, companheiro?, do Fernando Gabeira, para preparar as minhas aulas de 2014. Logo na parte I, encontrei um trecho que pode servir para algumas reflexões sobre os protestos de 2013. 
___Narrando como a resistência ao Golpe Militar acabou sendo fraca e desorganizada em 1964, Gabeira diz:
___Lembro-me de que, na saída do Sindicato dos Gráficos, meio corridos, e já ouvindo vozes do adversário na Rádio Mayrink Veiga*, resolvemos cruzar todas as ruelas ao lado da Rio Branco e evitar o tráfego. Numa delas, já estava tão deprimido que joguei uma pedra numa das vitrinas e sentei no meio-fio. Um amigo jornalista, mais experiente, voltou para me buscar: “Está bem que você seja idiota a ponto de achar que jogando pedras na vitrine você está resistindo. Mas não precisa ser demais, a ponto de jogar pedra e ficar aí parado”.

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___Antes que alguém resolva atacar o Fernando Gabeira, chamando-o de reacionário, antirrevolucionário ou algo do tipo por ter escolhido colocar essa historinha para ilustrar um dos parágrafos do livro, acho bom lembrar uma coisa: é possível encontrar muitas diferenças entre o Gabeira-político dos dias de hoje e o Gabeira-escritor-revolucionário de 1979. É sempre bom tomar cuidado com as análises.
___Antes que alguém resolva, utilizando como base esse trecho d’O que é isso, companheiro?, chamar todo manifestante, revolucionário ou afim de idiota é importante lembrar que esse é o livro em que o Gabeira conta sobre a sua participação no sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick para lutar contra do governo militar e salvar outros revolucionários. É sempre bom tomar cuidado com as análises.

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P.S.: Para mais reflexões sobre os protestos deste ano, recomendo, fortemente, o Rafucko

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* A Mayrink Veiga foi uma rádio carioca fechada pelos militares em 1965. 

8 de dezembro de 2013

Fom fom!

___As pessoas que andam de carro pelo mundo não costumam saber de várias coisas. Uma delas é como respeitar os pedestres. Mas, vamos passar por cima desse exemplo para tratar de outro tópico que os motoristas também ignoram: a utilidade da buzina. 
___Para a sorte de quem está atrás dos volantes, a doutora Ann Klaxon, da Miskatonic University, acaba de publicar um aprofundado estudo demonstrando que, mesmo que pareça ter mil e uma utilidades, as buzinas na verdade só servem para duas coisas:
1) Como sinal de alerta, para chamar a atenção de alguém e evitar acidentes. 

2) Para ser idiota. 
___A pesquisa da doutora Klaxon demonstra que o uso prolongado de automóveis tem uma grande chance de causar mal para o cérebro. O resultado é que o motorista lesado acaba tendo um irresistível ímpeto de se mostrar imbecil para todos à sua volta. Por isso que é tão fácil ouvir as pessoas buzinando. 
___Se bem que isso não parece uma grande descoberta. Além de demonstrar sua completa imbecilidade, por que mais uma motorista iria buzinar com força para um velhinho de bengala atravessando lentamente a faixa? Além da inquestionável idiotice, qual mais seria o motivo para, em um engarrafamento que vai até o horizonte, ficar tocando a buzina insistentemente?

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2 de dezembro de 2013

Quando a burocracia vence a Educação

___Lombrigas são parasitas. Para conseguirem sobreviver elas precisam se alimentar do seu hospedeiro, tirar energia do outro. Portanto, além de precisarem de outro para sobreviver, ainda o prejudicam. Mais do que isso: não há troca, o hospedeiro não ganha nada com isso, só sai perdendo. O mesmo acontece com a Educação, que vive sendo parasitada pela burocracia. 
___Eu trabalho em uma escola pública que, como é bem fácil de se imaginar fora das campanhas eleitorais, sofre com falta de recursos. Não é incomum faltar sabão e papel nos banheiros, material para consertar portas quebradas e goteiras do teto ou até mesmo livros para a biblioteca e giz para se escrever na lousa. Exatamente por isso, cada vez que um professor elabora uma prova o número máximo de páginas tem de ser duas. A falta de recursos para a escola faz com que os professores tenham de se deparar com esse limite muito pequeno de cópias por aluno. 
___Talvez algum leitor impaciente esteja pensando: “Já entendi, você está reclamando da falta de grana. Mas, por que atacar a burocracia no primeiro parágrafo e no título? O que a musa dos fabricantes de carimbos fez de errado?”. Calma, eu explico. 
___Por resolução da direção, ideia típica de burocratas educacionais que nunca entraram em uma sala de aula, agora os professores são obrigados a colocar, no início de cada prova, um grande elefante branco cabeçalho. 
A prova e o elefante branco (detalhe)
___Nome do aluno, número e série, eu admito, é algo necessário. O restante, entretanto, é ruído que só serve para ocupar o parco espaço da prova. Com a maior fonte da prova, os logos do governo e da sua autarquia; abaixo, menor, o nome da escola; data; nota. Curso, componente curricular e nome do professor, como se todas essas informações fossem grandes mistérios, insondáveis até mesmo para os alunos que fazem aquele curso e estudam aquela matéria com o professor que está, em sala, aplicando a prova. 
___Como se não bastasse, ainda é necessário colocar na prova as Competências/Habilidades e os Critérios de Avaliação. As primeiras são apenas um bando sentenças de efeito da área da Educação, buridiquez pedagógico para justificar os conteúdos ensinados e cobrados. Os Critérios de Avaliação servem para dar lastro para a correção dos professores caso algum aluno reprovado resolva abrir um processo por conta da nota ruim. 
A prova e o elefante branco
___Resumindo: por causa de bobeiras burocráticas perde-se praticamente metade de uma página. Lembrando que cada professor só pode pedir, às custas da escola, duas cópias por estudante. Perde-se um espaço importantíssimo que poderia ser utilizado para colocar textos, imagens ou qualquer outra coisa que pudesse ajudar a avaliar os alunos ou, mais tarde, para tornar mais didática a correção. E, mesmo se os professores não fossem utilizar para nada daquela metade da página, ela poderia muito bem servir para que os alunos escrevessem as suas respostas. Diagnóstico: para o governo a burocracia é mais importante que o ensino.

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___Escrevo tudo isso para denunciar e desabafar. Não vou pedir para que algum parasita da Secretaria da Educação* justifique a existência desses cabeçalhos inúteis e obrigatórios. Por que não? Porque, se por um milagre a resposta viesse, seria apenas um grande gasto de recursos públicos, com papeis que viriam em um buridiquez vazio para justificar o nada. Melhor assistir Seinfeld.
Seinfeld: "tudo sobre o nada"
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P.S.: Vale lembrar: no início deste ano, uma das palestras dadas aos professores foi exatamente sobre “Preenchimento e Entrega das Papeletas”. Não há dúvidas que a burocracia está vencendo. 

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* Ou, no caso, para da Secretaria de Desenvolvimento – que é quem “cuida” do Centro Paula Souza.